G1
Projeto do senador Dr. Hiran, que é médico, visa anular resolução do conselho de farmácia que permite a prescrição pela categoria. O Senado recebeu, nesta segunda-feira (24), um projeto de decreto legislativo para anular a nova resolução do Conselho Federal de Farmácia (CFF) que autoriza farmacêuticos a prescrever medicamentos, incluindo aqueles que exigem receita médica.A medida é uma ação em apoio ao Conselho Federal de Medicina (CFM) contra o CFF. A proposta foi apresentada pelo senador Dr. Hiran (PP-RR)."Mostra-se inteiramente descabida a interpretação que o Conselho Federal de Farmácia quer, a seu talante, dar ao disposto na Lei 13.021/2014, a qual também não autoriza que o Conselho Federal de Farmácia, violando completamente o Estado de Direito brasileiro", disse o senador, que também é médico.A proposta ainda precisa ser despachada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), para começar a tramitar. Mas, por ser um projeto, basta ser aprovada pelas duas casas do Congresso para passar a valer.Em sua justificativa, o senador do Progressistas chama a resolução do CFF de "ilegal" e "inconstitucional invasão" da área médica."A resolução também evidencia expressiva ampliação das atividades dos farmacêuticos, em patente violação à Lei do Ato Médico, e também atentatória à saúde de todas as pessoas que precisam de atendimentos que somente podem ser prestados por médicos(as)", justifica o senador. Além disso, Hiran lembra que a autorização para que os farmacêuticos também prescrevam medicamentos deveria ser "estritamente" por lei e não pelos conselhos de classe, conforme prevê a Le do Ato Médico."Ademais traz grave risco a saúde da população, uma vez que embora os farmacêuticos possuam conhecimentos sobre a fórmula bioquímica de medicamentos, não têm a formação médica necessária para diagnosticar doenças, realizar anamneses completas, interpretar exames clínicos de forma abrangente e definir tratamentos adequados e necessários para as mais diversas e abrangentes patologias", finalizou Hiran.Ministro da Saúde, Alexandre Padilha defende prescrição de remédios por farmacêuticos 'em alguns casos'Entenda a polêmicaA nova norma do CFF havia sido publicada no Diário Oficial de 17 de março e passaria a valer a partir do mês que vem. Com a nova resolução, a prescrição de remédios que precisam de receita estaria restrita ao farmacêutico que possua Registro de Qualificação de Especialista (RQE) em Farmácia Clínica.Entre outros aspectos, a resolução CFF Nº 5 DE 20/02/2025 permitiria que o farmacêutico:prescreva medicamentos (incluindo os de venda sob prescrição);renove "prescrições previamente emitidas por outros profissionais de saúde legalmente habilitados";faça exame físico de sinais e sintomas, realize, solicite e interprete exames para avaliação da efetividade do tratamento.Para isso, eles se basearam na licença que o farmacêutico tem de traçar o perfil farmacoterapêutico do paciente. Para o CFF, isso dá ao farmacêutico o direito de prescrever medicamentos e renovar receitas.'Absolutamente ilegal', diz CFM sobre resolução do Conselho Federal de Farmácia que permite prescrição de medicamentos por farmacêuticosAdobe StockAntes, disputa judicial sobre prescriçãoA nova resolução do CFF foi publicada poucos meses após uma decisão da 17ª Vara Federal Civil da Justiça no Distrito Federal contra outra norma do CFF sobre o mesmo tema. Ou seja, esta é uma segunda tentativa.A Justiça do DF declarou ilegal a resolução 586/2013 que permitia que farmacêuticos receitassem medicamentos e outros produtos que não exigiam prescrição médica. Ainda cabe recurso da decisão.A resolução é mais um capítulo na disputa por espaço no mercado de saúde no Brasil, como o mercado de estética. Recentemente, o g1 publicou uma reportagem explicando os bastidores da disputa entre entidades profissionais pela fatia do mercado de procedimentos.Reação das entidades médicasEm nota, o Conselho Federal de Medicina (CFM) afirma que a "prescrição exige investigação, diagnóstico e definição de tratamento, competências exclusivas dos médicos, conforme o artigo 48, inciso X, da Lei nº 12.842/2013 (Lei do Ato Médico), as Diretrizes Curriculares Nacionais do MEC e jurisprudências consolidadas. A norma do CFF é um atentado à legalidade e à segurança da população".O conselheiro do CFM Francisco Eduardo Cardoso afirmou ao g1 que a resolução é "absolutamente ilegal"."Deveriam ter vergonha de publicar uma resolução como essa. Eles vão ter que responder na Justiça por editarem uma resolução ilegal e que coloca em risco a saúde da população", diz Cardoso.Na visão do representante dos médicos, o CFF não pode legislar sobre prescrição, diagnósticos e consulta médica."O farmacêutico não tem competência legal e técnica para isso. É um ato de prevaricação. Eles já tentaram isso no passado e a Justiça negou. E isso será levado novamente à Justiça. O argumento de que eles entendem de remédios é insuficiente. São competências complementares", afirma Cardoso.A Associação Paulista de Medicina (APM) fala em "silenciosa invasão de profissionais não habilitados no ato médico" e manifesta preocupação com medida do CFF.Em nota, a APM afirma que a prescrição de medicamentos é fundamental para a segurança e eficácia dos tratamentos, pois envolve a orientação detalhada de um médico sobre quais medicamentos um paciente deve tomar, em que dose, com que frequência e por quanto tempo.A APM destaca que o médico cursa a faculdade por seis anos e depois ainda faz de três a seis anos de residência para se formar e poder estabelecer o diagnóstico e a terapêutica com segurança."Esta segurança vem com a história clínica inicial seguida de um minucioso exame físico. Mesmo assim, muitas vezes é necessário a solicitação de exames complementares para que a prescrição possa ser feita após um diagnóstico adequado. O farmacêutico não tem esta formação e, portanto, não tem a competência exigida para prescrever qualquer medicamento. Pode sim e deve indicar substituto para determinada droga, alertar sobre eventuais efeitos colaterais e interações medicamentosas", diz o presidente da APM, Antônio José Gonçalves.